terça-feira, 9 de novembro de 2010

April, 9

Era dia 09 de Abril quando me encantei pelas cidades, pelos prédios, e pelo mundo. Não sei. Sinceramente não sei porque isto aconteceu comigo, de uma hora para outra, enquanto eu estava preparada para ver o mundo como sempre via. Só mais um lugar onde pessoas competem pelo seu consumo, seus materiais, seu jeito de ser, sua identidade.
À parte, é mais simples ainda eu ignorar este assunto pois este não é o assunto em questão.
A principal coisa é que eu passei a observar melhor o mundo, as pessoas, como se elas fossem as protagonistas de um livro apaixonante e cheio de romances.
Eu sentia-me triste e feliz. Como eu, que sobrevivi neste mundo, neste mesmíssimo lugar nunca cheguei a observar não só as pessoas, mas seus atos, atitudes, atividades. Não só observar as casas, sua magnitude, espetacularidade ou horror, mas quem a criou. Não apenas observar animais na rua e dizer que eles são inúteis, imprestáveis, e não tem motivos para estarem ali.
O pior (até agora melhor) de tudo foi que eu encontrei um cachorro sem dono, sem casa e sem família, todo encardido e sem comida, andando pela rua. Com a minha observação aguçada, observei como ele estava procurando ajuda, um carinho, um abraço, uma casa, ou uma comida, que ninguém conseguia compreender.
Talvez possa ser uma raça desprivilegiada, já que ele era um vira-lata, apesar de isto nada me importar neste momento. Ele era lindo, se você fosse observar por dentro dos seus pelos, se você procurasse encontrar seus olhos. Pode ser que ele não tenha o cérebro do tamanho de um ser humano, a inteligência de um polvo, ou seja lá qualquer outra característica.
Mas eu observei, que no fundo dos seus olhos - e provavelmente de seu miúdo coração - que ele sabia por onde e pelo que ele estava passando.
Ele estava desprevinido, sem armas, sem vontade de matar, de machucar, de gritar, nada. Creio que ele só procurava carinho, ou alguém que te desse um lar que o estimulasse a vencer todos os dias que ele ainda iria vencer, só que com muita mais força.
Era interessante observar que ele apenas se aproximava da multidão apressada que passava na rua, dava uma gemida fraca e procurava que alguém o observasse lentamente, e entendesse por que perigo estava passando, pela dor que estava selada em seu peito.
A maioria ignorava aquele pequeno animal que atrapalhava na calçada. Outros gritavam, diziam que ele devia de sair do caminho - e o pobre animal se preocupava com os gritos, recuava e pensava que nada mais que isto acontecesse - e outros ainda chutavam aquele coitado, um animalizinho sem dono e com um destino distinto, irreconhecível e indeterminado.
Um dos mais enraivecidos, apressados, e ignorantes que passou pela rua foi um homem com aproximadamente 40 anos, que não via a hora de chegar no trabalho. O cachorro foi tentar 'conversar' com gemidos, com o tal homem, e levou chutes fortes, e ele acabou recuando - e recuou para rua.
Provavelmente está história você já conheça, ou provavelmente apenas sua continuação. Um carro passou deslizando pela pista, correndo como um louco, e atropelou o cachorro.
No fundo do meu coração eu senti dó. O homem nem havia se arrependido. Ele sim que devia de ter sido chutado pela multidão, sem nem se quer um pouco de pena.
Mas todos ignoraram o cachorro que agora tinha seu corpo, imóvel e coberto de sangue, naquela rua.
Coitado, morrera sem carinho, sem família, morto de fome, sem água, e sem ninguém que houvesse lhe dado atenção.
Sim, este momento para mim ficará marcado para sempre, como um flash de uma câmera que acaba de virar uma foto, e depois esta será revelada, guardada em minha mente. Coitado daquele vira-lata amarronzado, com os olhos claros, que eu nunca mais veria na minha frente.
Isto porque o restante do mundo ignora as coisas que vemos com rotina, normalidade, e esquece de observá-las com o melhor olhar do mundo, notando como tudo aquilo ocorreu, e não em um ritmo acelerado e ignorante, mas como um abraço em um cão que precisa de carinho.

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